Caros colegas.
Gostaria de, de vez em quando e para memória futura, partilhar convosco
algumas vivências do Songo, convido-vos a fazerem o mesmo.
No entanto, se acharem inconveniente, ou considerarem que este não é o
"local" certo, façam o favor de dizer.
Vou começar pela última.
Um abraço para todos.
Carlos Galvão
Regresso ao Songo.
A Joana foi "fabricada" no Songo, pelo Natal de 1985, voltou lá em Março
de 1986, como excesso de bagagem da barriga da mãe, mas nasceu em
Portugal. Alguma coisa de África lhe deve ter ficado (talvez os sons)
porque, volta não volta, lá vinha a pergunta sacramental:
-Pai, quando vamos a Moçambique?
Em Fevereiro do ano passado (2008) perguntei-lhe:
-Filha, estás a acabar a licenciatura, tens-te portado bem, qual é a
prenda que queres que te dê?
-Uma viagem a Moçambique!
-Tens a certeza?
-Tenho!
-Ok!
Tratei dos vistos, comprei os bilhetes e cá vamos nós, a caminho de
Moçambique e do Songo. O voo fez escala em Joanesburgo, apesar de não
termos saído do aeroporto, serviu para ela ter um primeiro contacto com
África, as lojas, a decoração do aeroporto, estava maravilhada. Mais 45
minutos e estávamos no Maputo e começaram as surpresas, tanto para ela
como para mim.
Encontrei um aeroporto limpo, com lojas a funcionar (comprei um cartão de
telemóvel), um bar no 1º andar sem bichas nem encontrões, casas de banho
limpas e a funcionar, caixas multibanco, rent-a-car... em 18 anos muita
coisa mudou.
Já na sala de embarque, à espera do voo para Tete, éramos os únicos
europeus, tudo bem, para a Joana era como se estivesse em casa, esta minha
filha adapta-se a qualquer situação, é uma cidadã do mundo!
Fizemos uma pequena paragem em Quelimane e eis-nos chegados a Tete. Mais
surpresas, lojas a funcionar no aeroporto (comprei água porque o calor era
muito), rent-a-car e um restaurante a funcionar no 1º andar. No regresso
comemos lá (frango à cafreal) e não se come nada mal. A Joana estava
cansada, com dificuldade em respirar por causa do calor, mas... maravilhada.
Outra surpresa, a carrinha da HCB devia estar à nossa espera, mas não a
via. Estava lá efectivamente, só que já não são laranjas, são brancas, e o
velho logótipo foi substituído por um mais moderno e bem bonito, por
sinal.
Uma volta por Tete (ufa, já não me lembrava como esta cidade é quente) e
toca a caminho do Songo, também aqui encontrei diferenças, mais carros na
estrada, as povoações cresceram muito, a Maroeira é quase uma cidade e já
não há controles, nem cancela na Maroeira. A Joana não tinha mais pilhas e
adormeceu a meio caminho.
18 anos depois volto a entrar no Songo e, como seria de esperar, também
aqui encontrei diferenças. O bairro Sul está maior, construíram-se mais
casas. Também construíram umas rotundas, há supermercado sem "fita" e sem
bichas, bancos, caixas multibanco, telemóveis, televisão por satélite,
restaurantes, bombas de gasolina, o clube foi concessionado ao Teles, que
explora o restaurante e aluga os quartos, enfim, um luxo. Há até um
lodge (UGUEZI) no Galiote para quem queira ficar à beira rio, com os
bungalows bem integrados na paisagem, com bar e restaurante, passeios de
barco, etc.
Era suposto ficar-mos alojados no clube, mas o Carrilho não deixou,
ficámos em casa dele. Reencontrei velhos amigos, alguns já não via há 18
anos, o Carrilho, o Bernardo, o Américo, o Teles, o Patarra, o Carlos
Lopes, o Zé Lessa, o Martins, o Henrique Silva (meu ex-colega no LNEC) e
tantos outros. Tive ainda a alegria de reencontrar o meu querido amigo e
ex-colega de trabalho Raul Torcida, pessoa que muito estimo.
O Bernardo emprestou-me um 4x4 e virámos o Songo do avesso, fomos a todo
o lado, até a sítios onde nunca tinha ido. A subestação e a central foram
reabilitadas e informatizadas, fomos também à Chitima e ao eléctrodo de
terra, fomos a Boroma via Tete e voltámos pelo mato via Marara (que
aventura), passámos um dia no rio, fomos aos hipopótamos e aos crocodilos,
fomos ao grande lago e, claro, apanhámos um grande escaldão.
Nunca 7 dias tinham passado tão rapidamente, fomos muito bem recebidos e
andámos numa roda viva de convites, não queria fazer desfeita a ninguém,
mas a agenda já não tinha espaço, na volta a Joana vinha com a lágrima no
olho, perguntei-lhe:
-Filha, do que gostaste mais?
-Do Bairro da Unidade!
Para quem não sabe, é o bairro mais pobre do Songo, decididamente, a minha
filha nunca deixará de me surpreender.
No regresso, o mesmo meio de transporte, carrinha até Tete (bolas, esta
cidade não arrefece?) e avião até Maputo, ainda voam os velhinhos 737 da
LAM.
O Pestana tem transfer, mas ainda que não tivesse, alugava-se um carro ou
apanhava-se um táxi, os poucos que existem estão no aeroporto.
Mais reencontros, o Hipólito, o Castro e o Abel. O Hipólito foi o nosso
cicerone durante dois dias, corremos a cidade, com passagem obrigatória na
Igreja da Polana, que aprecio especialmente, e paragem nos bons
restaurantes. Ainda houve tempo para uma escapada à Costa do Sol (o "4
Estações" foi demolido) para matar saudades daquele mar...
A Joana deslumbrava-se com as cores das flores das acácias, e com as
tonalidades da baía.
Terminada a viagem, ficou a vontade de voltar, talvez ainda este ano.
Faltou tempo para passar uns dias no lodge do Manna em Vilanculos, de papo
pró ar e a fazer rigorosamente nada, faltou tempo para ir ao Krugger com a
Joana ver os bichos, faltou tempo para um pulo à Gorongosa dar um abraço
ao Quim Castanheira e depois, não sei, talvez... voltar ao Songo.
Carlos Galvão.
P.S. Apenas três reparos, a limpeza da cidade continua a ser deficiente,
os meios de transporte funcionam mal, para gáudio dos "chapas", e a cidade
ainda tem muita gente que não tem nada que fazer e vive de expedientes. De
qualquer maneira, já estive em sítios no Brasil bem piores que este, se os
operadores turísticos descobrem Moçambique, vai ser um caso sério.